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Imagem retirada da internet, link aqui, |
Um verdadeiro "peteleco" a falta de bom senso de alguns. Espero que nem todos os Venezuelanos sejam, pensem e ajam como o falecido presidente. Vale a pena ler!
PUBLICADO
NO ESTADÃO DESTA
QUINTA-FEIRA
Retirado do link:
http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/a-mumia-a-critica-e-a-revolucao-por-demetrio-magnoli/
DEMÉTRIO MAGNOLI
Segundo assessores, Lula e Dilma Rousseff
interpretaram a decisão de embalsamar o cadáver de Hugo Chávez como,
essencialmente, uma estratégia eleitoral. Eles olham para outro lado, evitando
confrontar a incômoda realidade que, cedo ou tarde, assombrará o Brasil. A
múmia em Caracas é o indício inconfundível de uma regressão histórica da
esquerda latino-americana e, além disso, um sinal agourento de que os
sucessores do caudilho não pouparão a Venezuela do trauma da implantação de uma
“ditadura bolivariana”.
A mumificação deliberada expressa uma
exaltação do desejo de permanência. No antigo Egito, o corpo do morto devia ser
embalsamado para que ele vivesse eternamente, a fim de conhecer Osíris, a
divindade da vida após a morte. Na política laica contemporânea, a prática tem
um sentido radicalmente diferente, pois não se destina a promover um interesse
do morto, mas a exercer influência sobre os vivos. O morto deve ser eternizado
a fim de aprisionar o presente na jaula do passado, impedindo que a vida siga
adiante.
“O corpo do presidente Chávez será
embalsamado como Lenin e Mao”, anunciou Nicolás Maduro, o sucessor designado.
Nada indica que Vladimir Lenin desejasse ser convertido em múmia e Mao Tsé-tung
deixou assinada uma ordem para sua cremação. Os dois líderes revolucionários
consagraram-se ao empreendimento intelectual de embalsamar o pensamento de Karl
Marx, mas, justamente por isso, rejeitavam a ideia de que, um dia, eles mesmos
viessem a ser circundados pelo halo do sagrado. Ao contrariar a vontade
derradeira dos líderes mortos, enquanto juravam fidelidade imorredoura a seus
ensinamentos, os sucessores inseguros almejavam congelar a vida política,
perenizando-se no poder.
Crítica da economia
política é o
subtítulo de O capital. A
palavra “crítica” permeia os textos de Marx. O suposto inspirador dos líderes
mumificados no Kremlin e na Praça da Paz Celestial inscreve-se na linhagem do
pensamento iluminista: a “crítica”, em Marx, é um movimento racional de
recepção, interpretação e superação da tradição intelectual. O estabelecimento
de uma “verdade marxista” e sua calcificação como doutrina oficial representam
a negação do núcleo do pensamento “marxista”. O mausoléu de Lenin, uma
construção em granito reminiscente da tumba do imperador Ciro II, e o de Mao,
com sua fachada em colunas neoclássicas, são símbolos apropriados de regimes
bárbaros, apoiados sobre a bengala da violência política sem freios e devotados
à supressão extensiva da crítica.
Marx não foi, contudo, exclusivamente um
pensador. Existe um outro Marx, o doutrinário comunista, cujas ideias podem
funcionar como fonte de legitimação da barbárie totalitária. “Os filósofos se
limitaram até hoje a interpretar o mundo; cabe transformá-lo” ─ a última das
Teses sobre Feuerbach proclama, no fim das contas, que a revolução social é o
critério definitivo a respeito da verdade. A frase célebre foi eternizada na
parede de mármore do saguão da Universidade Humboldt, em Berlim, pelos
dirigentes da antiga Alemanha Oriental. Eles estavam dizendo que o poder
estatal comunista era a culminância da filosofia, a estação final do pensamento
humano. A reverência absoluta diante da verdade oficial: eis a exigência
simbolizada na mumificação de Lenin, Mao e, agora, Chávez.
Nas democracias, por definição, os estadistas
são pessoas comuns, sujeitas ao acerto e ao erro, cuja legitimidade deriva de
uma vontade popular circunstancial. Na Venezuela, o culto a Chávez atinge um
paroxismo, expresso no novo qualificativo que começou a circular durante o
velório: no lugar do “Comandante”, surge o “Líder Supremo da Revolução
Bolivariana”. A Venezuela já não é uma democracia, mas ainda não se fechou
atrás da muralha de uma ditadura. A iniciativa de embalsamar o líder morto
constitui um passo simbólico de largas proporções no rumo ditatorial. Por meio
dela se materializa na forma de uma múmia a declaração recorrente dos chefes
chavistas, que identificam a nação à sua própria corrente política. Chávez não
é Chávez, mas Simón Bolívar, ou seja, a nação inteira: isso é o que, de fato,
dizem os herdeiros mumificadores.
Em Cuba, o culto a Fidel Castro realiza-se
indiretamente, pelos cultos oficiais paralelos a José Martí e Che Guevara. “Ser
como o Che”, ensina-se aos cubanos desde os bancos escolares, significa
curvar-se à verdade do Partido. Na Venezuela, como sinal eloquente de que não
há uma novidade genuína no “socialismo do século 21″, a exigência de “ser como
Chávez” já faz parte da linguagem política utilizada pelos herdeiros do
caudilho. Esse tipo de linguagem, porém, não pode prosperar no ambiente da
democracia, que é o da crítica e da dissensão: a múmia de Chávez e as
liberdades públicas são termos alternativos na equação do futuro venezuelano.
A esquerda europeia aprendeu o valor da
liberdade numa longa trajetória pontuada pela Revolução Russa, pelo stalinismo,
pelas invasões soviéticas da Hungria e da Checoslováquia e pelas revoluções
democráticas de 1989. A
esquerda latino-americana não viveu tais experiências definidoras, apenas ouviu
seus ecos distantes. De certo modo, a Revolução Cubana e o mito de Che Guevara
forneceram-lhe uma casamata ideológica, isolando-a da crise histórica e moral
que lançou uma luz esclarecedora sobre as múmias de Lenin e Mao. Tomada no
interior dessa casamata, a decisão de embalsamar o corpo de Chávez entrelaça a sorte
da esquerda autoritária na América Latina à de um regime bolivariano em
declínio, que só pode oferecer a sombria perspectiva de uma ditadura
terceiro-mundista.
Antes de significar um salto ousado rumo ao
futuro, revolução designava apenas o movimento cíclico de eterno retorno dos
astros. A mumificação dos “líderes supremos” restaura o significado original da
palavra, anulando as suas associações com a crítica, a ruptura e a renovação.
4 comentários:
Sei não mas acho o que acontece ora na Venezuela, ora em Cuba nao significa um movimento organizado e sim isolado . Com a morte dessa gente morre as porcarias que fazem e dizem. Um Simom Bolivar aparece um em cada séwculo ou mais.Nem o Che, hoje, caiu de moda.
Parabéns pelo blog, muito bom. E agradecido pela visita ao Consoantes Reticentes. Abraços e sucesso.
A revolução é outra hoje. Com uma simples "canetada" paises desaparecem. Chávez, Fidel, e demais "caudilhos" não são mais nada além de ex-guerrilheiros, ex-combatentes, ex-lideres. Apenas EX! O povo de lá ainda não acordou. E diria mais, o daqui também não, afinal vira e mexe estão querendo elevar a categoria de salvador da pátria o Lulalá. Abração Zé!
Olá Marcelo tudo beleza? O seu também é muito legal. Obrigado pela visita! Abraço.
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